sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010
Quem parte e reparte
in Expresso Online (0:00 Quinta-feira, 11 de Fev de 2010)
ND: Artigo de opinião de Daniel Oliveira cujo conteúdo subscrevo na íntegra. O sublinhado é meu. CNC (Texto publicado na edição do Expresso de 6 de Fevereiro de 2010)
Há muito que o economista-chefe do FMI tem a solução para a crise portuguesa: baixar os salários para tornar as nossas empresas competitivas. Estas personagens que ciclicamente chegam de Marte já espalharam o caos em países como a Argentina. Mas isso não impede que, em Portugal, logo surjam papagaios a repetir o absurdo. Mais de 40% dos trabalhadores recebem menos de 600 euros por mês. Reduzir como? Quem resolveria os problemas sociais, políticos e até económicos que tal medida criaria? Quem trataria de mais uns milhões de pobres e endividados com emprego a juntar aos que já existem?
Dirão: contra factos não há argumentos e os portugueses não produzem para o que recebem. Certo? Errado. Os portugueses recebem pouco mais de metade da média europeia. A sua produtividade é 70% da europeia. Como se vê, a suposta falta de produtividade dos trabalhadores portugueses tem as costas largas. Talvez seja altura de perceber que não há economias competitivas na Europa que sobrevivam à custa de salários baixos e pouca qualificação.
O maior défice é outro: somos o país mais desigual da Europa. Se o nosso salário mínimo está bem abaixo da média da zona euro e o nosso salário médio está a metade, já os nossos gestores recebem, se contarmos com subsídios e remunerações variáveis, acima dos seus colegas europeus. Bem sei que ninguém lhes chega aos calcanhares, mas é difícil explicar porque é que um gestor alemão recebe 10 vezes mais do que o trabalhador com o salário mais baixo na sua empresa, o britânico 14, o espanhol 15 e o português 32. Alguém se pergunta que valor têm acrescentado às empresas portuguesas estes gestores de luxo? Por isso, quando se fala em reduzir salários não seria mau explicar quais.
Claro que se eu aqui disser que se devem baixar os salários dos gestores me chamam populista. Mas se se trata de baixar o salário de quem já vive com quase nada estamos perante alguém que, sendo realista, apenas quer salvar a nossa economia.
O problema de Portugal é democrático. Os salários miseráveis que são pagos à maioria dos trabalhadores e os salários absurdos que os gestores determinam para si próprios são disso prova. E a invisibilidade desta injustiça no comentário económico dominante é apenas a confirmação pública da desigualdade privada. Para que os que menos têm aceitem como inevitável e justo o desprezo a que estão destinados. Uma mensagem têm recebido nestes anos: vocês ganham muito, vocês trabalham pouco. De tanto ouvirem, um dia acreditam.
A minha liberdade
Não gosto do que Mário Crespo foi escrevendo no "Jornal de Notícias". Mas a censura de que foi alvo é gravíssima. E não é para apoiar aqueles com os quais concordo que defendo a liberdade de expressão. É para defender a minha liberdade. Como muitos portugueses, estou convencido que Sócrates quer dominar a comunicação social e calar vozes incómodas. Mas a divulgação de informações sobre escutas telefónicas que não foram usadas pela justiça é um insulto aos direitos cívicos. E não é para proteger os meus amigos e aliados que faço questão que os nossos telefonemas continuem privados. É para defender a minha liberdade. Demasiada gente se tem esquecido que depois de Sócrates e Ferreira Leite este país continua. E há portas que depois de abertas nunca mais se conseguem fechar.
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