terça-feira, 9 de março de 2010

Drama da Madeira previsto 7 dias antes


CM (09 Março 2010 - 00h30 - André Pereira)

Meteorologia: Professor alertou para falhas no Instituto

O Governo estava avisado das limitações técnicas dos sistemas utilizados pelo Instituto de Meteorologia (IM) e das consequências da má previsão meteorológica. A afirmação é de Delgado Domingos, professor catedrático no Instituto Superior Técnico (IST), coordenador do grupo de Previsão Numérica do Tempo, que responsabiliza o IM pelas consequências da catástrofe registada há três semanas na ilha da Madeira. O catedrático acusa o presidente do IM, Adérito Serrão, de "falta de conhecimentos técnicos". O IM lamenta a "utilização das vítimas para promoção de um produto".

Na origem da polémica está o trabalho de Delgado Domingos, também membro da Sociedade de Meteorologia Americana, no qual recorre a dados obtidos pelo modelo utilizado no IST sete dias antes da catástrofe na Madeira. Segundo o próprio, "teria sido possível às autoridades alertar as populações, usando o mesmo modelo do IST para o continente, e preparar os meios de socorro mais adequados".

Desde António Guterres, garantiu ao CM Delgado Domingos, que "os governos têm vindo a ser alertados para a possibilidade de qualquer dia haver uma situação de catástrofe devido ao sistema utilizado no Instituto". "O resultado foi zero. O que me escandaliza é que já não é dinheiro que se perde, mas sim vidas", acrescentou, criticando Adérito Serrão: "O actual presidente é um gestor sem os conhecimentos técnicos de um meteorologista. É o único interlocutor no caso da Madeira e diz um monte de disparates. Até se perdoa a um gestor, mas ele fala em nome do Instituto e é inadmissível que invoque um lugar administrativo para se arrogar a uma competência científica que não tem."

Adérito Serrão não se encontra no País. A resposta chegou via comunicado. O Instituto de Meteorologia "lamenta a utilização das vítimas resultantes do temporal da Madeira para promoção de um produto".

PORMENORES

MODELO DO IST

Entre os modelos usados no Técnico estão o MM5 e o WRF, os mesmos do serviço de meteorologia norte-americano.

SERVIÇO GRATUITO

Segundo Delgado Domingos, os dados do IST estão em http://meteo.ist.utl.pt.

DISCURSO DIRECTO

"O PRIMEIRO ALERTA TERIA SIDO EMITIDO DIA 14", Delgado Domingos, Professor do IST e membro da Sociedade de Meteorologia Americana

Correio da Manhã – Como funciona o modelo de previsão meteorológica do Instituto Superior Técnico (IST)?

Delgado Domingos – Este modelo não foi inventado no IST. É um modelo público, também utilizado pelo Serviço Nacional de Meteorologia norte-americano. O mais avançado modelo de previsão meteorológica, que o AROME [utilizado pelo Instituto de Meteorologia português] tenta imitar. Consegue prever situações com sete dias de antecedência. Quando se registam valores acima de determinados parâmetros, é emitido um pré-aviso automático, com a indicação de que há algo a merecer uma melhor observação. De seis em seis horas, essa informação é confirmada.

– Como garante que podia ter previsto a catástrofe na Madeira com sete dias de antecedência?

– O que fiz foi reconstituir, com os dados do dia 14, o que se teria passado na Madeira, se tivesse aplicado o mesmo modelo que usamos para o continente. Qual não foi o nosso espanto quando verificámos que no primeiro dos sete dias antecedentes já se previa que, até dia 20, a precipitação acumulada ultrapassaria os 500 mm. Se a Madeira estivesse no nosso sistema de previsão, o primeiro alerta teria chegado às autoridades por volta das 08h00 do dia 14, sob a forma de um email para os serviços responsáveis, alertando para uma situação preocupante. Com quatro dias de confirmações e observação de satélites, no dia 17 o nosso sistema teria recomendado um alerta vermelho.

– Qual a razão de a Madeira não estar no vosso sistema?

– Porque ainda não pediram. Se me for pedido, poderei demonstrar este modelo de forma gratuita para a Madeira e Açores.

– Quem são os beneficiários do serviço de previsão do IST?

– Faço a previsão de ventos para a REN, devido à energia eólica, e para a Protecção Civil de Lisboa.

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